Saturday, 27 May 2017

FÚRIA DA CHINA SOBRE O RATING DA MOODY: RECESSÃO A ORIENTE OU POLITIQUICES...

Será que o atrevimento da agência de rating Moody em baixar o rating da dívida soberana de longo prazo da China da Aa3 para A1, apesar da China continuar a ser a segunda maior economia do mundo e em rota para ultrapassar os EUA, é prenúncio de uma ressecção a escala mundial ou mais um passo na erosão da credibilidade das agencias de rating do (desumanos) sistema capitalista mundial?

Se olharmos a evolução dos ratings (classificação ou notação do risco) da Moody, sendo esta uma agência de notação/rating americana, que prenuncia uma possível crise da divida soberana da China temos que perceber como  é  que se classifica as solvências ou insolvência da mesma para podermos perceber porque a China está furiosa com este rating da Moody, senão vejamos.

Se uma agência de notação de risco, é uma empresa que, por solicitação de clientes, qualifica determinados produtos financeiros ou activos (tanto de empresas, como de governos ou países), avalia, atribui notas e classifica esses países, governos ou empresas, segundo o grau de risco de que não paguem suas dívidas no prazo fixado. Quando esse risco de inadimplência se refere a operações de crédito concedido a um Estado soberano ou ao seu Banco Central, é chamado risco soberano. Quando o risco se refere contratos de crédito firmados com a totalidade dos agentes (públicos, incluindo entidades internacionais e não soberanas, ou privados) de um país, utiliza-se a expressão risco país. Cada agência de notação de risco possui uma rating/taxonomia própria. Quanto maior for a probabilidade de moratória do agente, pior será a sua nota ou a sua classificação. Geralmente, utiliza-se a escala A, B, C, D. Na escala da Moody, a melhor classificação é Aaa; a pior é C. Notas acima de BBB- ou Baa3 dão ao agente o grau de investimento, enquanto que os classificados abaixo dessa nota recebem o grau de especulação ou lixo.

Mesmo que existam muitas agências de rating espalhadas pelo mundo (todas privadas), apenas quatro (a Fitch, a Moody’s, a Standard & Poor's, todas norte-americanas, e a canadiana DBRS) são reconhecidas mundialmente para avaliar o risco de estados e empresas e tem magnatas como Carlyle ou Warren Buffet como alguns dos grandes investidores.

Para entendermos do porque a China estar furiosa, é que um dos problemas é que sendo empresas privadas cujo objectivo é o LUCRO, e cobram comissões as avaliações de riscos aos estados/empresas o que traz, então, um conflito de interesses: uma empresa paga a agência para ser avaliada, e a agência, para manter o cliente, pode fazer uma análise mais positiva dessa empresa. E Isto foi visto durante a crise financeira de 2005-2007 onde se viram muitas agências de notação trabalhavam sobre títulos e produtos financeiros que mal conheciam o verdadeiro risco. Como as avaliações eram dadas notas artificiais e inflacionadas, quando chegou a altura de cobrar muitos títulos ficaram sem pagamento para os seus detentores por inadimplência dos países emissores. A crise criou um problema de credibilidade destas agências, e um problema que se mantem até hoje

Outro problema é  quem financeiramente supervisiona financeiramente estas agencias, são os governos onde têm as suas sedes, e as das quatro mais importantes três são reguladas nos EUA. Existe uma dependência em relação ao poder político onde estão sediadas a quem prestam contas o que não há em relação a outros países. E a forma como se avalia determinados países pode ser influenciada pelo tipo de poder do dia, neste caso a administração Trump e o seu “America First”.  Daí que seja pouco provável que estas agencias se atrevam a dar uma avaliação de “lixo” aos EUA como deram a vários países nu mundo incluindo Moçambique.  Como as agencias de rating não são todo-poderosas na economia mundial ou nas economias onde estão domiciliadas, precisam do poder político. Neste caso, o poder que a Moody detêm em relação a qualquer estado decorre das regras determinadas pelo governo dos EUA. E quando a Moody diz, por exemplo, que só compre activos de um país se a classificação/notação for acima de "lixo", o que estão a fazer é delegar uma grande e todo-poderosa influência. Mas é o Governo dos EUA que confere a esta agencia de rating o poder que têm, o de secar a torneira do crédito a um determinado país. Esta actuação da Moody pode também ser lida como um instrumento político de pressão financeira sobre os estados igual a que foi dada através do Banco Mundial e FMI. Ao dar esse poder às agências de rating estão a dizer aos estados-membros para se comportarem de determinada maneira ou, em alternativa, a alterar o comportamento financeiro desses países, o que lhes condiciona muito a sua política financeira. Preocupações de que estas agencias podem não estar agindo de forma isenta , pode ser o que originou o enfurecimento da China.

Como a escala, no mínimo, significa alta probabilidade de não pagamento das dívidas dentro do prazo acordado e, no topo, total capacidade de pagamento, uma letra ou um conjunto de letras com um mais ou um menos à frente são suficientes para destruir toda uma economia, todo um país, toda uma população, ter de mudar de vida e apertar o cinto, daí o poder enorme destas agências de notação financeira.

Para quem investe dinheiro é essencial ter uma noção do risco de um país/ empresa em relação a outras ou até de o risco relativamente ao futuro. Ao emprestar dinheiro à país/empresa, o investidor pretende ter de volta o capital. Os títulos de dívida do país/empresa podem ser assim comparados pelos investidores, tendo em conta o risco. Quanto mais arriscados os investimentos, maior a taxa de juro que o devedor pagará, é essa análise que os investidores decidem se investem ou não.

A evolução do rating/taxonomia de uma crise é observada através da dinâmica da dívida e do défice orçamental tomando como base os limites de Maastricht (100%) como um limiar crítico para a sustentabilidade como referência. A combinação do rácio da dívida em percentagem do PIB (D) com o saldo corrente em percentagem do PIB (SO) permite a caracterização da situação de um país tendo uma dívida: 
A dívida é INSUSTENTÁVEL quando é [D > 100 e SO > 3];  
A dívida é  CRÍTICA quando  [D > 100 e SO < 3 e D < 60 e SO > 3];  
A dívida é PREOCUPANTE quando [D > 60 e SO < 3, D < 60 e SO > 3];
A dívida é  CONFORTÁVEL quando [D < 60 e SO < 3]

Olhando a definição de como se faz o rating, a dívida da China em % do PIB  (D) é  de 42.90% e o Saldo Orçamental (SO) é  -3.80. Ou seja, com as receitas do Estado situados +-$16 Biliões, o país gasta (gastos públicos) +-$18 Biliões o que cria um salto negativo digamos de $2 biliões, com um risco de crédito 79.5. As cinco ultimas classificações da Moody foram Novembro 2009-A1 positivo, Novembro 2010-Aa3 Positivo, Abril 2013-Aa3 estável, Março 2016  Aa3 negativo, e Maio 2017-A1 estável.

Se comparamos a China das outras duas principais economias do Mundo, Japão e EUA, veremos que: a dívida do Japão em % do PIB  (D) é  de 250%e o Saldo Orçamental (SO) é  -4.50. Ou seja, com as receitas do Estado situados +-$16 Biliões, o países gasta (gastos públicos) +-$106 Biliões o que cria um salto negativo digamos de $44 biliões, com um risco de crédito 77.6. A ultima classificação do Moody é de A1 estável em Dezembro de 2014, precedida da de Agosto 2014-Aa3 estável, Maio 2011-Aa2 negativa sob vigilância, Fevereiro 2011-Aa2 negativa e Maio 2009-Aa2 estável;  e a dívida dos EUA em % do PIB  (D) é  de 104.17% e o Saldo Orçamental (SO) é  -3.20. Ou seja, com as receitas do Estado situados +-$455 Biliões, o países gasta (gastos públicos) +-$18 triliões o que cria um salto negativo digamos de $18 triliões, com um risco de crédito 97.00 %.00. A ultima Classificação do Moody foi em Junho de 2013-Aaa Estável, precedidas de Agosto 2011-Aaa negativo, Julho 2011-Aaa negativo sob vigilância, Fevereiro 1949 Aaa estável. Lembremos que a ultima crise financeira e recessão dos EUA foi nos anos 2005 a 2007 (criado pelos Lehman Brothers durante a administração W. Bush) e Administração Obama debelou de 2008 a  2012.  

Apesar de não ter nada a ver com este post, abriria um parêntesis aqui para termos uma ideia do porque a China esta furiosa com o rating da Moody, vamos ilustrar as classificações que ela deu a Moçambique: Julho 2016-Caa3 negativa sob vigilância, Maio 2016-Caa1 negativa sob vigilância (a famosa de lixo), Abril 2016 Caa1 estável, Março  2016 B3 negativa, Dezembro 2015-B2 negativa sob vigilância, Agosto 2015-B2 negativa, Setembro 2013-B1 estável. A divida de Moçambique que se estima que esteja a 135% do nosso PIB, ou seja $11 biliões (e não quero discutir a legalidade da mesma aqui), foi maioritariamente contraída por causa de factores como  globalização e liberalização financeira mundial que permite práticas de alto risco nos mercados de crédito encorajadas pelas condições de crédito fácil e barato. Foi a existência de crédito fácil  (dinheiro a mais para emprestar) no mercado internacional que levou o governo a dar aval aos empréstimos contraídos pelas empresas PROINDICUS, EMATUM e MAM aos bancos Credit Suisse International e VTB Capital, em mais de $2 biliões. Quando existe muito dinheiro para emprestar que os bancos são capazes de te empurrar para contrai-lo, o problema será sempre como pagar.

Voltando o essencial deste post, os títulos da dívida soberana da China eram considerados mais ou menos seguros, isto é, a capacidade do Governo Chinês para pagar a divida, que diga-se de passagem é até  maioritariamente de investidores internos. O que era inquestionável desde 1898 (ano do massacre de Tiananmen), a capacidade da China pagar a sua divida, foi posto em causa pela Moody. O principio é as agencias de rating não mexem a classificação de risco de crédito de um países só por mexer. Quando mexem é prenúncio de que há problemas.

A Moody não acredita que o rácio de dívida, total e acumulada da China seja sustentável, ou seja,  a Moody não acredita no crescimento económico da China continue nos actuais 7% a 10%. E sendo uma economia virada também as exportações, a sua desaceleração deixaria um excesso a sua capacidade industrial e imobiliária o que põe nervoso todo mundo.  Uma desaceleração de uma economia com tentáculos mundiais como a China que é detentora de títulos das dividas soberanas   de países como os EUA já podemos imaginar o reboliço que isto esta causar. 

Por outra lado, se esta classificação, diga-se  de passagem está muito longe dos níveis de inadimplência, for infundada reacende o debate que os europeus uma vez disseram que iriam criar as suas próprias agencias de rating para não ficar dependente das avaliações das americanas, que noutras vezes  falham nas suas avaliações o que põe em risco a sua credibilidade. Por exemplo, a credibilidade e independência das agências de rating falhou durante a crise financeira que começou nos Estados Unidos em 2005-2007 com as especulações super elevadas no sector imobiliário ou quando a Islândia que, tendo um rating muito elevado, entrou em bancarrota por estar em situação de inadimplência muito agudo. É disso que poder estar a levar que a China esteja furiosa e questione a relevância dessa avaliação se bem que nenhum mercado ou país seja obrigado a aceita estes ratings.  

No comments:

Post a Comment